A arte de pescar à pluma...


Dedico este espaço à modalidade de pesca à pluma, revelando as minhas aventuras, peripécias e toda a minha experiência pessoal...

Catch and release!

segunda-feira, 29 de março de 2010

Aventuras de pesca no Rio Poio

A pesca à pluma, para além das particularidades já referidas, tem um detalhe de extrema importância que é a hora da eclosão! Isto é, quando começa o frenesim dos insectos para eclodirem que fazem com que as trutas entrem em autêntica actividade: chegou a hora delas para papar… Com efeito, em Março, a melhor hora para pescar é quando o Sol está a pique, entre as 12 e as 15 horas. Quando nos aproximamos do Verão as melhores horas são efectivamente ao amanhecer e ao entardecer.

Aventura:
Tínhamos combinado no dia anterior a hora de partida para o Rio Poio, em Ribeira de Pena. Assim, de madrugada, passei por casa do meu bom amigo e companheiro de pesca, “Quim Ribães”, o Sol ainda não se tinha levantado, mas tudo previa um belíssimo dia de Verão. Com um largo sorriso arrancamos com tudo a preceito, muito embora madrugador e ainda sob o efeito do néctar do Deus Baco da noite precedente. Mas nem esse efeito nem a noite mal dormida nos demovia do nosso ânimo para tal aventura. O sorriso estava sempre presente, bem como a fé de capturar um deslumbrante exemplar.

Após uma breve paragem para tomar um café chegamos ao local bem cedo, o Sol acabara de nascer. Estava relativamente fresco. Vestimo-nos para a ocasião, de fato, botas e colete, pegamos nas respectivas canas e pusemos os pés ao caminho. Entramos por um caminho cabreiro junto ao rio, que logo terminou junto a uns “esfregões”, umas grandes rochas que cercam este rio naquela zona, conforme se verifica nas fotografias. Questionando-nos se deveríamos voltar e começar pelo trajecto de um outro caminho mais acima, junto ao monte, resolvemos continuar bem pertinho das nossas amiguinhas sarapintadas. Nada nos demovia naquela manhã, pois a fé era tanta…

Bom, a coisa complicou-se inesperadamente. Escorreguei no primeiro penedo e caí numa zona de corrente de água violentíssima. Comecei de imediato a lutar contra aquela corrente, nadando, a respiração parava por breves momentos, enquanto a água gélida entrava em contacto com meu peito e, aos poucos, enchia o fato de pesca. Estava aterrorizado e consciente do perigo que causaria a água a entrar no fato de pesca, um peso adicional como se de chumbo se tratasse. É como um saco plástico cheio de água e fechado, vai “de prego ao fundo”. O meu amigo, Quim Ribães, preocupadíssimo, decidido em retirar-me da água, desceu com bravura aquele penedo colocando-se também em perigo. Esticou uma perna e gritou para que me agarrasse à bota que trazia calçada. Lutando contra aquela corpulenta corrente de água, após umas boas tentativas frustradas, lá consegui agarrar-me com firmeza na bota deste meu grande amigo, fazendo com que este breve e especial momento ficasse bem gravado na minha mais sagrada memória. Com alguma peripécia conseguimos subir o penedo até uma zona de relativa segurança. Estava branco, esquálido, encharcado da cabeça aos pés, tremia por tudo quanto era lado. O Quim, imediatamente e sem questionar, tirou-me o colete e ajudou-me a tirar a roupa e o fato. Fiquei como Deus me trouxe ao mundo. O Sol, que já se via ao longe, contribuía para que aos poucos me fosse aquecendo. Naturalmente, começamos por torcer as meias e assim sucessivamente à medida que vestia aquela roupa mais para o molhado que húmido. O momento estava nostálgico, o Quim já se estava a preparar para voltarmos para o carro quando eu lhe disse que o dia ainda agora tinha começado. De imediato olhamo-nos bem nos olhos e demos uma grande gargalhada…

Por norma os sítios quase inacessíveis são os menos pescados e as trutas têm mais tempo para crescer sem serem capturadas…

Após uma boa jornada naquela difícil zona chegamos a um sítio que nos permitiu começar a pescar. Logo ao primeiro lançamento uma truta de grande calibre fez com que rebentasse a linha de pesca. Mudamos de imediato para uma linha mais potente! A coisa prometia mesmo…

O Quim, um pouco mais à frente, pesca uma truta de considerável dimensão. O episódio da queda na água dissipou-se imediatamente. O meu frio também. A expedição tinha agora começado com a excitação daqueles dois momentos de pesca efectiva. Não me lembro de pescar sucessivamente senhoras trutas e, note-se, autóctones! O contentamento foi tanto que nem notamos as horas passarem, nem tão-pouco a barriga dera sinal. Quando chegamos à vila já eram 16 horas. Da forma como estava vestido mais parecia um “cowboy” acabadinho de chegar do “Far West”. O sorriso nos lábios era mútuo. Chegamos a um restaurante, indicado por um taxista que nos recomendou quando o questionamos para o efeito. Após uma consulta no menu, unanimemente pedimos cabrito assado no forno. Era Domingo, dia de cabrito como na minha terra. A menina que nos serviu era bastante simpática e conversadora, ocasionou que lhe consultasse a sina. Disse-lhe que iria conhecer, muito breve, um belo rapaz e que muito provavelmente a levaria ao altar… bom, o meu amigo Quim, que é um pândego, interagiu brilhantemente fazendo com que aquele momento se passasse de forma divertida, na boa companhia do néctar do Deus Baco e daquela belíssima rapariga que espero que tenha encontrado o seu promitente noivo, pois segundo ela afirmara, o último tinha-a deixado plantada no altar…

Despedimo-nos e, pouco depois de termos saído do restaurante, apanhamos uma boleia de um rapaz que, curiosamente, também era pescador de trutas e partilhou connosco algumas das suas aventuras (mentiras de pescador) enquanto aquela viagem durou, pois o carro estava a uns bons quilómetros de distância.

Chegamos a casa já era noite…

segunda-feira, 15 de março de 2010

Efectivamente pescando - Intróito




Quando chego ao rio, para além de uma boa esticadela no corpo cansado da viagem e de apreciar aquela paisagem natural, a primeira análise que, na maioria das vezes, faço é tentar descobrir em que zona da água  as trutas se encontram a alimentar, isto é: no fundo do rio (alimentando-se de larvas ou ninfas); a meia-água (alimentando-se dos insectos em fase de eclosão ou insectos mortos, que já tenham depositado os seus ovos no fundo do rio, ou que tenham caído na água por qualquer razão); à superfície, junto à película da água (na fase de eclosão); e até mesmo fora de água  (quando os insectos bebem água, ou depositam ovos, ou por outras razões...). Para além dessa verificação tento também saber que ordem de insectos é que por ali deambulam. Eu costumo identificá-los nas teias de aranha que se encontram construídas perto das margens do rio, como também é meu hábito efectuar essa consulta nas pedras do fundo do rio para desta forma confirmar, através das ninfas ou larvas e pelo seu actual estado, quais as plumas (iscos artificiais) que irei usar com mais intensidade. Mas existem ainda diversas formas de consulta e técnicas de pesca que fazem com que esta modalidade de pesca seja efectivamente a rainha dos pescadores...



Metamorfose dos insectos...


Relativamente às técnicas de pesca, existem três: com mosca seca (imita insectos que pousam ou caem na superfície da água); com ninfa (imita larvas, pupas e outros insectos que ainda não eclodiram) ou com streamer (imita pequenos peixes ou insectos que caem na água).

Devido ao exposto rapidamente chegamos à conclusão que teremos que naturalmente possuir umas caixas bem recheadas de moscas nas suas mais diversificadas fases. Porquanto, a grande maioria dos insectos aquáticos colocam os ovos no fundo do rio, completando o seu ciclo de vida com a sua morte. Daí que há quem diga que a vida é efémera, pois nasce-se num dia e morre-se noutro. Ora os insectos sofrem diversas transformações, desde o ovo até serem adultos. Designamos essas transformações por metamorfoses. Existem insectos que têm uma metamorfose completa e designam-se larvas quando imaturos. Mais tarde, passam por uma fase de pupa, antes de se tornarem adultos ou imagos. Estes insectos, no seu estado larval, são muito diferentes de quando chegam a adultos. Os tricópteros são o exemplo de uma metamorfose completa. Os insectos que têm uma metamorfose incompleta, são chamados de ninfas quando imaturos, não passam pela fase de pupa e são quase sempre parecidos com aquilo que vão ser, quando chegarem a imagos. Praticamente só lhes faltam as asas enquanto juvenis. É o caso das nossas famosas efémeras. A enxúvia é o nome da última carapaça quando o insecto está a emergir para se tornar subimago. Assim, temos o ovo, a larva (relativa à metamorfose completa), a ninfa (metamorfose incompleta), a pupa (sendo, pois, a segunda fase de metamorfose completa), o subimago ou dun (refere-se a alguns insectos que já se libertaram da "enxúvia" mas ainda não são completamente adultos. Exemplo disso são as efémeras quando acabam de sair da água, mas ainda não têm as asas secas e transparentes. Estes subimagos podem voar ou trepar para algum ramo ou pedra para secarem as asas. Imago será a fase em que o insecto já apresenta um par de antenas, três pares de pernas e normalmente dois pares de asas. Chegou à fase de adulto e está pronto para o voo nupcial em que acasala, a fêmea deposita os ovos na água e a seguir morre. Por fim, temos a fase de spent que é o que chamamos ao insecto depois deste morrer e vir rio abaixo com as asas abertas.(1)


De uma forma mais simplificada os ovos passam a larva ou ninfa (dependendo da sua ordem  na classe insecta), passando por um ciclo de amadurecimento e posteriormente é que  concluem a sua metamorfose ganhando asas e partindo para a vida livres até ao momento que, por vezes, aparece uma belíssima truta no ar e lhes ceifa a vida... 
Bom, as fases que nos interessam aqui para esta modalidade de pesca são de facto as larvas, ninfas, pupas, subimagos e imagos. Na fase larval os pequenos insectos encontram-se dentro dos casulos em forma de larva, como se tratam da maior parte dos tricópteros. Na fase de ninfa encontram-se junto às pedras do fundo do rio. Na fase de amadurecimento, isto é, quando já se encontram prontas ou quase prontas para eclodirem, efectuam várias investidas até perfurar a película da água. Como a seguir à agua está o ar faz com que se exerça uma força autêntica nessa película. Ora, um pequeno insecto para a perfurar tem que subir e descer imensas vezes até conseguir o seu intento. Após o sucesso, já fora da película e em contacto com o ar, dá-se a conclusão da sua metamorfose abandonando a sua casa, pelo que após um triplo gole de "Redbull" levantam voo até horas mais tarde concluírem o seu ciclo de vida, ou colocando os ovos na superfície da água e consequentemente morrendo, ou perfurando a película para colocar os ovos no fundo e terminando assim a sua vida. E é assim que estes fantásticos seres cumprem a sua missão de manutenção.  Para registo, já tive a oportunidade de assistir a uma eclosão de uma libelinha que demorou aproximadamente 2 horas!...  

Tudo isto faz com que o conhecimento desta panóplia da fauna aquática seja para mim deveras interessante e conclua que a natureza é de facto fabulosa!

São indescritíveis e desmesuradas as sensações que tenho tido ao longo destes anos com o contacto com o rio: desde ver umas pequenas lontras a brincarem na água; patos bravos a chocarem os seus ovos; pequenos insectos a eclodirem; cachoeiras; e paisagens magníficas fazem com que nos sintamos especiais para podermos partilhar com o mundo estas energias boas que efectivamente não se vêem mas que naturalmente se sentem...



(1) (http://www.gforum.tv/board/855/39785/introducao-entomologia.html) 

domingo, 14 de março de 2010

Montagem de moscas


Montar moscas é de facto uma arte artesanal que exige concentração, meticulosidade e bastante precisão. Também exige, como já escrevi atrás, conhecimento de entomologia, isto é conhecer os insectos e a fauna aquática. Tanto os insectos terrestres como os aquáticos são na sua maioria o principal alimento das trutas. Os terrestres mais importantes são os dípteros (moscas e mosquitos), os coleópteros (besouros e escaravelhos) e os ortópteros (gafanhotos e grilos). Relativamente aos insectos aquáticos são os tricópteros e as ephemeras. Daí que para enganar uma truta de razoável dimensão - com doutoramento - é necessário que se pareça o mais natural possível por forma que ao cair na água iluda os olhos deste belíssimo peixe.












Flyfishing


















Para mim pescar à pluma (flyfishing) é sem dúvida alguma um desporto de verdadeiro lazer, de autêntico relaxamento. É uma modalidade que se destina essencialmente a pescar salmonídeos. No entanto, também se destina a outras espécies de peixes: tanto de mar como de rio.

Em Portugal, os salmonídeos que se encontram são as trutas fário, as trutas mariscas e os salmões do atlântico. Quanto às trutas arco-íris, infelizmente, já se vêem em alguns ribeiros e rios, pois a sua origem é na América do Norte. Devido ao seu rápido crescimento, em relação às trutas fário, os proprietários dos viveiros criam-nas com a finalidade de as comercializar para consumo interno. Estes viveiros situam-se à beira dos rios e devido a factores, quer naturais quer humanos, algumas destas trutas acabam por “escapar” para os rios, levando desta forma a contribuir para uma das causas da não preservação das nossas trutas autóctones - fário - com as suas pintinhas vermelhas e pretas que tanto as demarcam das outras congéneres.

Os salmonídeos de minha preferência são sem dúvida alguma as trutas fário, quer pelo seu mimetismo, característica camaleónica, quer pela sua voracidade. São muito ágeis, tímidas e difíceis de enganar (pescar). Ora, para capturar "estas meninas" necessário é ter umas boas caixas carregadas com vários exemplares de iscos artificiais que vulgarmente designamos por moscas ou plumas. Estes iscos são fabricados em casa manualmente pelo pescador ou compradas nas lojas da especialidade. Eu, como faz parte do percurso natural de um verdadeiro pescador de pluma, manufacturo-as em casa durante o período de repouso, isto é, o período de defeso que se destina essencialmente à desova dos peixes. Montar moscas também faz parte do relaxamento desta modalidade, pois é uma arte meticulosa. A matéria-prima para a sua construção são os anzóis, as plumas, as penas de aves, as peles de alguns animais e os produtos artificiais de vários feitios, cores e origens.

Os salmonídeos alimentam-se de insectos, vermes, crustáceos, moluscos e de pequenos peixes. A necessidade de enganar este exímio peixe, para além da técnica de lançamento, é de facto o isco. Para tal é necessário conhecer bem a fauna aquática, o meio onde se insere este tão apetitoso ser. Note-se, porém, que o aqui referido apetite é para pescar!... Pois eu defendo até à última circunstância a PESCA SEM MORTE (catch and release).